quarta-feira, 16 de abril de 2014

O filho do meu avô

Fico imaginando ele pelos céus. Atravessando as nuvens. Logo eu que penso que o homem não foi feito prá voar, e que não enfrento o vôo sem uma pitada de estranheza, ainda que sem medo. Já soube, mas não sei mais o seu nome. Não deve ter meu sobrenome, nem as minhas manias, também não deve portar a nossa questão fundamental, a minha e a dos demais homens da família, aquela que nos lança ao mundo em busca de resposta. Porém, deve ter a sua própria. O que significa ser da mesma família? Não basta ter os genes, bobagem irrelevante. É preciso dividir algo além de um monte de fatores microscópicos. O que o atravessa enquanto ele atravessa as nuvens? Será algo do qual partilho? Provavelmente não terei a resposta. Nunca saberei se tenho um familiar perdido por aí, pilotando aviões, ou se é apenas o filho do meu avô.

terça-feira, 8 de abril de 2014

Só um

Ele podia conhecê-la. E continuar conhecendo-a para além e permanentemente. Gente não é lago, não tem profundidade na medida em que não tem onde alcançar o pé. Mas seu amor não era do tipo seguro. Não havia o mínimo de razão, não havia sequer uma tábua que pudesse acolher alguma lei autorizando. Pensou na vida que tinha e em tudo que não sabia  que queria. Quando entrou naquela rua, ao virar aquela esquina, jamais poderia dizer que não sabia dos riscos. Pensou em tudo isso e concluiu que seu incômodo não era esse. Voltou a refletir. Sempre fora seguro de si, desconhecia seu ardor por controlar. E ela não era de se deixar, não era de se privar, dos amores que por ventura aparecessem. Suspirou. Percorreu aquele corpo seguindo as pistas deixadas por outros. Certas marcas, sinais de calafrios. Havia raiva, não por saber que ali haviam estado e ainda iriam estar, mas por imaginar, temer no seu íntimo, que como outrosera só mais um.