segunda-feira, 4 de novembro de 2013

O monstro da criança

   Era noite... Er... É, definitivamente era noite. Eu estava de frente para a casa, a goiabeira a minha direita, mais precisamente a garagem se mostrava na direção do meu nariz. Podia ver lá no fundo o muro que delimitava o espaço da casa, a área de limpeza e a dispensa. Não havia ali uma alma viva e era essa justamente a preocupação, isto é, que houvesse ali alguma alma solta do corpo. Aquela mesmíssima cena já havia ocorrido uma dezena de vezes, sempre tudo não passava de uma impressão ruim. Daquela vez havia algo estranho. Não saberia dizer exatamente o quê. Posicionei meu olhar matreiro para aquele corredor fantasmagórico. Um vento vindo do nada varreu o chão levantando uma poeira e fazendo dançar uma sacola de supermercado que estava por ali. A tensão ia aumentando pouco a pouco, minha respiração já se ocupava de oxigenar o corpo, como que preparando cada músculo para um possível perigo. Porém a garagem, o fundo da casa e tudo o mais continuavam como sempre.
   Eis que dando-me conta de quantas vezes aquilo já havia ocorrido, percebi que possivelmente havia ali um exagero da minha parte, e talvez o perigo era meramente coisa da minha cabeça (o que naquela circunstância nada significava) e por fim, não aconteceria algo diferente mais uma vez. Poderia continuar a sonhar, quem sabe um daqueles sonhos em que se voa, sempre agradáveis.
   Naquela noite não podia estar mais errado. Do corredor traseiro da casa surge a alguma altura do chão a criatura assustadoramente esperada, e ele sim voando, num rasante deslizando-se em minha direção. Nessas horas é preciso correr. Saí dali em direção a porta da casa. Não foi sem surpresa que observei que por ali estavam alguns membros da minha família, e é claro nenhum com a mínima disposição para me ajudar naquela situação pavorosa. Continuei rumando para dentro da casa, na esperança cega e alienada de quê do lado de dentro havia segurança. Nunca saberia, pois ao puxar a grande porta de metal, finalmente a criatura que por tantas noites não dera a cara, me agarrou antes que eu colocasse os pés para dentro, e me lançou para fora da casa, para fora do sonho, para fora. 
   Nunca mais estive naquela situação, quem sabe porque a criatura estava satisfeita com seu susto final, em como deixara a criança apavorada e como não dera chances ao garoto. Seu rasante perfeito e direto. Sua garra precisa. É... Talvez isso, ou simplesmente por que agora, eu que ainda tinha dúvidas naquela noite, não podia mais negar a existência do meu monstro e a dolorida solidão com que se é obrigado a lidar com o dito cujo.

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